Eu disse que precisamos de uma nova filosofia de progresso para o século XXI (leia nossa tradução deste texto aqui). Isso implica que o mundo precisa não apenas dos estudos do progresso, mas de um movimento do progresso: a defesa de um conjunto de ideias.
Quais são essas ideias?
Vejo três premissas no centro desse movimento: progresso, humanismo e agência.
O progresso como fato histórico
O ponto de partida e motivação para os estudos de progresso é o fato histórico das enormes melhorias nos padrões de vida materiais nos últimos ~200 anos. Essa observação é tão amplamente reconhecida e incontestável que Deirdre McCloskey a chama de “o Grande Fato”. Todos na comunidade do progresso olham para os últimos séculos e concluem que, não importa como interpretemos ou reparemos, algo obviamente deu muito certo.
Uma posição nitidamente contrastante é o declinismo: a ideia de que o mundo está piorando. Um declinista pode pensar que os benefícios da energia não compensam os custos da poluição, que o valor dos carros não redime seu papel em acidentes ou congestionamentos e que os prazeres da mídia social são superados por seus danos psicológicos e sociais. Talvez até caçadores-coletores estivessem em melhor situação do que nós, modernos, e a agricultura fosse um erro. (Alguns não irão tão longe, mas expressam agnosticismo sobre a questão, ou simplesmente são indiferentes ao progresso material, cumprimentando-o com um encolher de ombros).
Mas se o progresso é real e importante - como julgamos isso? Como justificamos que as melhorias nos padrões de vida materiais são boas? Que o progresso tecnológico e industrial representa um verdadeiro progresso para a humanidade?
O humanismo como padrão de valor
O humanismo diz que o bem é aquilo que nos ajuda a levar vidas melhores: vidas mais longas, saudáveis e felizes; vidas com mais escolhas e oportunidades; vidas nas quais podemos prosperar e florescer. Este é o padrão proposto, por exemplo, por Steven Pinker em O Novo Iluminismo.
Para ser claro, isso não significa simplesmente satisfazer nossas necessidades materiais básicas, como barrigas cheias e camas quentes. Pode abranger tudo o que faz a vida valer a pena, incluindo necessidades psicológicas como emoção, aventura, romance, beleza, conhecimento, exploração e conexão humana.
A oposição ao humanismo muitas vezes vem de alguma forma de romantismo. Uma forma é a romantização da natureza: a natureza como uma “mãe” amorosa e protetora; ou um estilo de vida “natural” como limpo, seguro e saudável. Outra é a romantização do passado, de tempos “mais simples” ou de tradições perdidas. Assim, o progresso é criticado pela esquerda porque invade o meio ambiente e pela direita porque representa o “materialismo” e a “decadência” modernos.
O humanismo diz que quando melhorar a vida humana requer alterar o meio ambiente, a humanidade tem precedência moral sobre a natureza; quando exige derrubar a tradição, a vida hoje e no futuro tem precedência moral sobre o legado do passado.
Uma crença na agência humana
A agência é a crença de que nosso futuro é moldado por nossas escolhas e ações. Temos um alto grau de controle sobre nosso destino. Assim, o progresso contínuo é possível, mas não garantido.
Eu escolho deliberadamente “agência” em vez de “otimismo”, para maior clareza. “Otimismo” pode significar coisas diferentes. O otimismo prescritivo é uma atitude filosófica que nos orienta para uma ação confiante. O otimismo descritivo é uma previsão sobre para onde as coisas estão indo – o que depende dos fatos de qualquer caso. Se essas duas formas de otimismo forem combinadas, isso pode fazer com que a confiança se transforme em complacência. Acho que é por isso que alguns escritores do progresso, como Steven Pinker e Hans Rosling, resistem ao rótulo de “otimista”. Rosling se autodenominava um “possibilista”; eu propus “solucionista”.
O oposto de agência é o fatalismo. O fatalismo assume muitas formas. Uma é a crença de que somos incapazes de compreender sistemas complexos ou de controlá-los; que mexer com eles inevitavelmente criará consequências não intencionais e, portanto, é perigoso demais para ser tentado. Outra é a ideia de que o progresso depende de recursos naturais limitados e que, à medida que esses recursos se esgotam, o progresso inevitavelmente estagnará. Um erro comum cometido por muitas formas de fatalismo é presumir que não haverá novos avanços na ciência ou na tecnologia, simplesmente porque não os vemos chegando e não podemos fornecer evidências de quando acontecerão. De qualquer forma, o fatalismo vê o progresso como um acaso da história: tivemos uma boa corrida, foi divertido enquanto durou, mas agora precisamos nos acostumar com taxas de crescimento menores, tendendo a zero ou mesmo negativo.
O progresso é confuso; resolver problemas muitas vezes cria novos. Acreditar na agência humana não é negar isso, mas acreditar que os novos problemas geralmente são melhores de se ter e que esses problemas podem ser resolvidos por sua vez.
Minha identificação dessas três ideias centrais é parcialmente descritiva e parcialmente prescritiva. Acho que esses conceitos ressoarão fortemente com a maioria dos meus leitores, mas os escolhi e formulei de acordo com minhas próprias crenças, de uma forma que acho que formará uma base intelectual para um movimento do progresso.
Tudo isso deixa muito espaço para discussão, discordância e debate, não apenas sobre as consequências dessas ideias, mas também sobre sua definição e interpretação. Quanto dos últimos 200 anos foi bom, exatamente? E a guerra, a poluição, a desigualdade? O que constitui o bem-estar humano? As pessoas desejam muitas coisas; quais de seus desejos são legítimos, saudáveis, valiosos? Devemos tentar agregar bem-estar (como no utilitarismo); e se não, como navegar conflitos entre interesses individuais? Devemos incluir o bem-estar dos animais em nosso padrão? Quanto controle temos e como gerenciamos os riscos - tal como os riscos de mexer em sistemas complexos? Essas são questões importantes sobre as quais espero que tenhamos debates saudáveis.
Omiti deliberadamente quaisquer premissas explicitamente políticas. A comunidade do progresso inclui uma variedade de opiniões políticas, de libertários a progressistas. Recentemente, tivemos Eli Dourado enfatizando o papel das regulamentações na desaceleração do crescimento; o Projeto Fronteira de Inovação que propõe o aumento dos gastos federais em P&D em energia geotérmica; e Ezra Klein defendendo maior crescimento econômico para que haja mais para redistribuir aos pobres. Eu gostaria que os conceitos de progresso, humanismo e agência servissem como um terreno comum a partir do qual possamos ter debates produtivos. Com um objetivo compartilhado, podemos examinar quais políticas e princípios realmente alcançam esse objetivo, e todos podem tentar provar seu caso com história, economia, ética e lógica.
Quando Tyler Cowen e Patrick Collison cunharam o termo “estudos de progresso”, eles pediram um “movimento intelectual de base ampla focado na compreensão da dinâmica do progresso” e “visando o objetivo mais profundo de acelerá-lo”. Eu enquadrei a questão da seguinte forma: “se o progresso é um imperativo moral, também é um imperativo moral entender suas causas, para que possamos protegê-las e reforçá-las. Precisamos fazer três perguntas: Como chegamos aqui? … Por que demorou tanto? … Como vamos continuar?”
Acho que as três ideias que delineei são necessárias e suficientes para motivar tal esforço. O declinismo, o romantismo ou o fatalismo derrotariam essa motivação. Mas a crença no progresso, no humanismo e na agência implica isso.
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Autor: Jason Crawford
Tradutor: Davi dos Anjos
Revisor: Fernando Moreno
Publicado originalmente aqui.

Arte, cidades, liberdade, justiça e progresso