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outubro 8, 2021

Há muitos anos já são usados termos para caracterizar quem defende ideias ou pessoas específicas, por exemplo, os marxistas e os hegelianos. Na internet, principalmente no Twitter, são populares expressões que definem alguém como fanático de algum politico, os conhecidos “minions”, como “Bolsominions”, “Cirominions” ou “Lulominions”. Existem até termos mais pejorativos.

O fato é que o fanatismo político é comum, mas pouco se sabe sobre o que explica o fato de algumas pessoas abrirem mão de uma análise mais crítica para se entregarem a um comportamento de tribalismo. Como escreve o filósofo e escritor alemão Arthur Schopenhauer: "para a maioria das pessoas é mais fácil morrer do que pensar”, ou como dizia Sêneca: “todo mundo prefere crer a julgar”. A essência desse contexto é que concordar é bem mais fácil do que pensar, principalmente quando alguma ideia vem de alguém que admiramos como referência em algum assunto. Isso ocorre pelo comportamento natural do cérebro de sempre buscar economizar energia.

Para entendermos isso, sugiro a seguinte interpretação: toda opinião é como uma estrutura semelhante a de uma árvore, tendo sua base, raízes e ramificações. A base de uma opinião seria um ou mais fatos que serviriam de alicerce para sustentar todas as ramificações seguintes. Estas seriam posições específicas e as raízes seriam as premissas. Exemplo: José acredita que a terra seja plana, pois o horizonte é reto. A base dessa opinião, o motivo que a sustenta, é o ponto de que o horizonte é reto. Logo, ao provarmos o que ocorre de fato, provando que o horizonte não é reto, contrariando a sustentação, desestruturamos a base e, pela lógica, demonstramos que não há razão para aquela opinião.

O foco dessa interpretação, portanto, é mostrar que toda posição tem motivos vinculados a ela. Esses motivos são cruciais para entendermos a visão de alguém: são os argumentos. O problema está na individualidade de cada um que está sujeita aos vieses psicológicos. Vamos relembrar a estrutura, o que a mantém de pé é a base que a sustenta, mas nem toda base pode ser contrariada por argumentos pelo fato de que nem toda base é composta por argumentos lógicos ou de mesma valorização. Isso podemos denominar de vieses, processos cognitivos que acontecem de forma inconsciente e que influenciam nossa opinião, visão e percepção sobre os fatos à nossa volta. 

Em um sistema de representação indireta, é normal que pessoas defendam políticos por, teoricamente, serem os representantes de suas ideias. O problema está quando essa defesa torna-se algo personalista. O melhor jeito de perceber quando isso acontece é buscar qual é a base dessa opinião. Exemplo: João defende um candidato azul pelo combate à corrupção, então esse candidato realmente defende ou diz defender? O que de fato já fez? Quem ele apoia? Questionamentos simples podem ser o suficiente para perceber esse tipo de base. Mas João pode não fazê-los por está sujeito ao Viés de Ancoragem. Esse tipo de viés torna a opinião inicial sempre em vantagem a uma possível mudança de opinião, ou seja, permanecer na mesma opinião é mais fácil e confortável.

Se nos atentarmos aos fatos, podemos observar que eles possuem valorização diferente para cada pessoa. Ao analisar um fato, qualquer um é passível de ser influenciado por um Viés de Confirmação. Isto é, algum fato que comprove ou reforce a sua opinião inicial tende a ser hipervalorizado. Seguindo a mesma lógica de economizar energia, confirmar opiniões já existentes é mais simples do que assumir algum engano. “Nada supera para o homem a satisfação de sua vaidade e nenhuma ferida dói mais do que aquela que golpeia esta vaidade” descreve Schopenhauer. Isso pode ser entendido até como um mecanismo de defesa inconsciente para manter a plenitude de sua vaidade, ainda mais quando consideramos a possibilidade de influência do Efeito de Manada. As pessoas buscam o conforto da aceitação de um grupo, logo acabam escolhendo o caminho que outra pessoa ou grupo decidiu para se sentir importante, seguindo outros como em uma manada.

Muitas vezes, os mecanismos de defesa podem se manifestar a partir do uso de argumentos ad hominem: argumentar com intuito de descredibilizar o argumentador em vez do argumento com ataques ou constatações a pessoa, pois é mais fácil ver alguém de opinião diferente como mal-intencionado ou tolo que assumir a possibilidade de um erro próprio.

Outra forma de evitar o confronto de ideias é usar de Bulverismo. Esse conceito se refere a assumir o argumento contrário a sua ideia como obviamente errado e argumentar sobre a intenção do oponente com o seu uso. Exemplo: em um debate sobre o que causa a desigualdade social no Brasil, Arthur defende que o maior causador é o modelo de estado atual, Pedro defende que é da própria natureza do capitalismo. Arthur argumenta que os países de menor intervenção econômica são os de melhores índices sociais, mas Pedro responde que isso está errado e que ele só defende isso para beneficiar grandes empresários. Não precisamos discutir os motivos de Arthur defender isso para entender que sua intenção não influencia na lógica de sua argumentação, logo Pedro realiza um ad hominem como forma de desvio de atenção e fuga do debate. 

Temos também opiniões baseadas em autoridades. “Todo mundo prefere crer a julgar”, com os argumentos ad verecundiam que se baseiam em usar autoridades como validadores. Exemplo: Maria acredita que a Terra é redonda, pois foi ensinada assim por sua professora de geografia. A base dessa opinião é ela reconhecer sua professora como especialista nesta área, mas questionamentos simples podem mostrar que Maria não sabe exatamente. Isso é problemático pois qualquer um pode estar errado, e se a pessoa insiste nesse tipo de base, dificilmente Maria vai mudar de opinião enquanto a autoridade tiver credibilidade, o que cria uma tendência ao uso de ad hominem.

Então as discussões entre pessoas são bem mais complexas que um lado certo e outro errado. Mesmo com o uso de exemplos para explicar os vieses, estamos tratando de algo que pode influenciar qualquer um, seja de esquerda, direita, liberal ou socialistas, não importa. Pois é algo humano e não há solução melhor que admitirmos a nossa própria ignorância quando for o caso, assumindo sempre a possibilidade do nosso próprio erro e nunca deixando de questionar o que nos acontece. Não se trata de grandes esforços, apenas basta perguntar “Por que?”, “Como?” ou “Para que?”.

2 comments on “Por que é tão difícil discutir com fanáticos?”

  1. Texto bem estruturado, me chama a atenção o passeio multidisciplinar que faz, integrando política, psicologia e economia. Parabéns! Que deixemos de ser enviesados cada dia mais.

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