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agosto 22, 2021

Não podemos retroceder a economia aos padrões de 2014, onde o mercado demonstrava pessimismo quanto às condições financeiras do Estado brasileiro em financiar suas dívidas.

Fizemos um grande esforço na gestão Temer para salvar as contas públicas e retomar a confiança dos investidores, um dos “porquês” da criação da PEC do teto de gastos. Esse foi um dos maiores avanços nas reformas econômicas dos últimos anos e a resposta necessária desde o baque das pedaladas do governo Dilma Rousseff. Novamente, perder essa credibilidade financeira seria um imenso regresso. Não dá pra fechar os olhos e permitir que esse prestígio restaurado seja desperdiçado. Precisamos assegurar a imagem de que somos um país que honra suas dívidas.

Obrigações sobre precatórios já era um tema encerrado em 2009! Foi definido como despesas obrigatórias após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que sentenciou que, caso a União postergue precatórios, isso será definido como crime de responsabilidade fiscal. Retomar debates a este nível é retroceder a patamares nível governo Dilma.

No mês de agosto os dias têm se mostrado tensos para o mercado nacional quando o ministro da economia Paulo Guedes tem endossado parcelar despesas propostas à União (precatórios), que nada mais são do que dívidas decorrentes de condenação judicial transitada e julgada. O mercado reagiu com um olhar de desconfiança a esse posicionamento de “devo não nego pago quando puder”. Adiar precatórios é calote, gera um alerta vermelho sobre a saúde das contas públicas do governo federal. Sempre foi dificultoso receber dívidas do governo. Não é nenhuma novidade que estados e municípios têm o costume de atrasar suas dívidas, mas não a União.

O calote de dívidas do governo federal é diferente de quaisquer outras partes do Estado. O governo federal é o grande financiador de todas as obrigações do país e, por isso, para onde os olhares se voltam. Quando ele não consegue honrar suas dívidas a credibilidade do país tende a cair. Isso traz inúmeros problemas, tais como: debandada de financiadores da dívida pública, aumento da taxa de juros, instabilidade no câmbio (aumento do dólar), queda dos níveis de investimento, dentre outros indicadores.

Por que agora se discute parcelar precatórios?

Restando apenas um ano para a chegada das eleições, o governo pretende inflar o valor do Bolsa Família (agora rebatizando de renda Brasil) para aumentar sua popularidade, típica façanha realizada por políticos em período eleitoral. O presidente chegou a mencionar um benefício de R$500 por família mas acabou reduzido o valor a R$400. Bolsonaro achou por bem então emitir uma PEC para economizar R$33 bilhões do orçamento com precatórios e conseguir passar essa manobra para aumentar o benefício social.

Isso só agravará um problema que já era grave. O aumento dessa obrigação só vem aumentando vertiginosamente desde 2010, quando era de R$13,9 bilhões. Neste ano chegou a R$54 bilhões, e, para 2022, o valor deve chegar a R$89 bilhões. Por isso Paulo Guedes chamou o fenômeno de “meteoro dos precatórios”.

Talvez estejamos diante de uma nova lei econômica, aplicável aos ministros responsáveis pela economia do Brasil: a capacidade para a criação de metáforas cresce em relação direta com sua incapacidade de resolver os problemas que suas metáforas buscam explicar.

Algumas propostas do governo com a PEC dos precatórios

  • A proposta do governo federal seria escalonar essa dívidas.
  • Pagar de forma crescente de quem deve menos a quem deve mais.
  • Destinar 2,5% de repasses das receitas líquidas para esses pagamentos.
  • Precatórios acima de R$ 450 mil seriam pagos uma primeira parcela de 15% no ano vigente e o restante parcelado em 9 parcelas (regra que seria constante se a medida fosse aprovada).
  • Usar 20% das privatizações para o Renda Brasil, 20% para pagar precatórios, e os outros 60% abateriam a dívida pública. Na legislação atual parte das receitas são destinadas apenas para abatimento da dívida pública.

Ficou claro que não há folga no orçamento para efetuar tal ousadia com o benefício social e o governo não conseguirá cumprir com o Renda Brasil. Com a aprovação do orçamento de 2021, já tinha ocorrido esse embate em distribuição de emendas parlamentares. O governo distribui ali R$48,8 bilhões e já sabia que teria dificuldades à frente com despesas obrigatórias (previdência, abono salarial, seguro-desemprego, subsídios, dentre outros).

Deixar de lado essa dívida traria um problema chamado moral hazard (perigo moral): as suspensões de pagamento vão acontecendo num círculo vicioso, sempre havendo uma oportunidade de não pagamento dos precatórios, deixando dívidas para os próximos governos.

Ao decorrer dos anos, com o prolongamento das parcelas, haveria dificuldades de quitação aos credores, de modo que o governo federal iria se tornar o que são alguns dos estados nos dias atuais, como por exemplo o Distrito Federal, em que 50% das dívidas do estado são precatórios.

Algumas possíveis consequências do calote nos precatórios

- Aumento da percepção de risco para investidores.

 - Elevação da dívida pública, que sinaliza uma dificuldade futura de ser um país que honra com suas contas.

- Para contornar o problema e compensar o risco, o Banco Central tende a elevar a taxa de juros que remunera a dívida pública (como Selic), distorcendo os juros entre o Brasil e os demais países.

 - Elevando a taxa de juros domésticas, o capital nacional passa a ser mais caro para o tomador de crédito, reduzindo investimentos privados e o PIB e aumentando o nível de desemprego.

- Para países com renda média e baixa, com uma dívida de até 90% do PIB, aumentar a dívida significa reduzir o crescimento.

- Redução das prestações de serviços ao Estado, pois os profissionais só irão prestar serviços se as recompensas forem realmente grandes.

- Complexidade no sistema de correção e aplicação de juros. Quando o processo for encerrado os credores terão dificuldade em saber qual valor real que têm a receber.

Mudança nos olhares dos investidores na credibilidade das contas públicas

Nem todo brasileiro tem tamanho capital para receber precatórios a esse valor, mas, de fato, mesmo que seja dificultoso, é uma obrigação. Há causas que estão há mais de 10 anos tramitadas e sem prazo de recebimento. Sempre foi muito burocrático.

O grande problema está em querer criar gatilhos fora do teto de gastos, uma medida que pode ser considerada como pedalada fiscal. De fato, a impressão que dá é que o governo pretende dar uma “esticada” na dívida. Não é algo que passa confiança e previsibilidade econômica ao investidor, especialmente o estrangeiro. Soa uma deterioração da saúde financeira de nossa economia e um risco fiscal, afundando o preço dos ativos, aumentando os juros cobrados pelo mercado em operações com títulos públicos, e um aumento na taxa Selic emitida pelo Banco Central. Isso estica ainda mais a deterioração do real, que se desvalorizou nesses últimos anos.

O próprio Banco Central se posicionou contra a medida e avisou que não há espaço para um benefício social dessas proporções. Houve um grande desgaste com a PEC Emergencial, que já criava o início de um ajuste fiscal suspendendo concursos e reajuste de servidores. A blindagem da PEC Emergencial foi falha e não conseguirá responder aos problemas dos gastos públicos, a não ser que o teto seja estourado. Esse é um dos motivos de tanto malabarismo fiscal.

Fim da era de um Brasil potência que honra com suas obrigações

É um enorme retrocesso ter que discutir esses tipos de movimentações desde a queda do governo Dilma. Essa atitude é parecida a um default – é quando o devedor decide não cumprir um contrato de empréstimo ou dívida que alcançou. Se o Tesouro não quitar essa dívida independente de PEC, formulação legal, isso se configura como um calote.

Parcelar obrigações para inflar gastos em período eleitoral é outra irresponsabilidade absurda. Um governo avisar que ficou surpreso com crescimento da dívida demonstra um enorme despreparo. O país que é pego de saia justa com os valores de dívidas já consolidadas deixa qualquer investidor com pé atrás.

Avançamos em 2016 com a criação do teto de gastos. Essa medida, além de retornar ao país sua boa imagem, abriu espaços importantes na política brasileira. O movimento atual é um passo atrás nas conquistas implementadas há cinco anos.

Fontes

Precatórios: Parcelar pagamento é calote? (uol.com.br)

Pedalada? Calote? PEC dos precatórios e os impactos no mercado financeiro | Hora de Investir | Valor Investe (globo.com)

'PEC do calote' vai afetar mais de 4 mil precatórios do INSS; confira | Economia | iG

Pedalada? Calote? PEC dos precatórios e os impactos no mercado financeiro | Hora de Investir | Valor Investe (globo.com)

Proposta de parcelamento de precatórios desagrada mercado, que fala em calote | Poder360

Entenda a polêmica sobre postergar o pagamento de precatórios | Política | Valor Econômico (globo.com)

Parcelamento deve atingir 1 em cada 10 precatórios do INSS - 06/08/2021 - Grana - Agora (uol.com.br)

Parcelamento de precatórios pode afetar até R$ 40 bilhões em dívidas do governo - Economia - Estadão (estadao.com.br)

Parcelar precatórios não criará espaço fiscal para Bolsa Família, diz economista (cnnbrasil.com.br)

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