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janeiro 17, 2021

Neoliberalismo é essencialmente um termo intencionalmente impreciso usado para a economia de livre mercado, para as ciências econômicas em geral, para o conservadorismo, para libertários e anarquistas, para o autoritarismo e militarismo, para o progressismo de centro-esquerda "orientado para o mercado", para o globalismo, para a social-democracia e o estado de bem-estar social, para aqueles que são a favor ou contra o aumento da imigração, para os que favorecem ou se opõem ao comércio e a globalização, enfim, para qualquer conjunto de crenças políticas que sejam antipatizadas pela pessoa que esteja utilizando o termo.

Phillip W. Magness

Neoliberalismo Fase 1

As primeiras menções a palavra “neoliberalismo” já aparecem entre o fim do século XIX e início do século XX podendo ser encontrados raros usos do termo em algumas publicações.

Porém, o conceito só foi melhor elaborado após a Grande Depressão de 1929, quando acadêmicos liberais europeus começaram a absorver críticas ao liberalismo clássico, e assim se puseram a formular um liberalismo onde houvesse espaço para interferência estatal, mas sem se deixar levar por um intervencionismo excessivo.

Tais economistas buscavam alguma coisa que se situasse no meio termo entre o total laissez-faire e a economia planificada totalitária, fosse ela soviética ou nazifascista. Esse movimento ganha ímpeto heroico na resistência de intelectuais liberais e protestantes às ideias políticas e econômicas de Hitler. Caso deseje se aprofundar nesse aspecto, recomendamos que leia sobre o Círculo de Friburgo e a Igreja Confessante.

E é nesse momento, mais especificamente em 1938, que chegamos ao primeiro uso dado ao neoliberalismo. Foi no Colóquio Walter Lippman que o termo neoliberalismo foi cunhado por Alexander Rustow referindo-se à necessária reformulação do liberalismo. Um ex-socialista desiludido com a União Soviética, Rüstow queria traçar uma “terceira via” entre o laissez-faire e a economia planificada.

Não tem como enfatizar suficientemente o quão importante foram os intelectuais desse período: algumas das ideias político-econômicas mais interessantes do pós-guerra - e, o mais importante, as que funcionam! - começam a ser gestadas nesse período, tal como o Ordoliberalismo, Economia social de mercado e a própria já mencionada Terceira via. São esses intelectuais que dão origem a essas ideias. São as ideias desses intelectuais que, uma vez colocadas em prática pelos políticos da Alemanha e da Áustria pós-guerra, tiraram esses países da total miséria causada pela insanidade nazista e os colocaram, em tão poucas décadas, no grupo das economias mais avançadas, prósperas e inovadoras do mundo. Se quiser se aprofundar mais sobre isso pesquise também sobre O Milagre do Reno.

Neoliberalismo Fase 2

Nas décadas de 70 e 80, porém, o neoliberalismo ganhou fama ao ser atrelado aos governos Reagan nos EUA, Thatcher no Reino Unido, e também ao governo ditatorial de Pinochet no Chile. O que rendeu impopularidade ao termo, sobretudo em meios de esquerda. Geralmente quando se fala em neoliberalismo (especialmente na esquerda latino-americana), é a imagem destes governos e de suas premissas e consequências socioeconômicas que se refere.

Neoliberalismo Fase 3

Na década de 90 o governo Clinton nos EUA dá novas cores ao neoliberalismo, alinhando o equilíbrio dos gastos governamentais a um progressismo nos costumes, e maior atenção ao impacto ambiental. Diferente do neoliberalismo de Pinochet ou Reagan, o neoliberalismo a partir da década de 90 se localiza ao centro. Progressismo com responsabilidade fiscal. A esse movimento se somaram os de Tony Blair e mesmo os de Fernando Henrique no Brasil.

Clinton nada mais foi do que o ápice do projeto dos New Democrats, uma facção ideológica centrista dentro do Partido Democrata nos Estados Unidos. Como a facção da Terceira Via do partido, eles apoiam o liberalismo cultural, mas assumem posições fiscais moderadas. Os New Democrats foram por sua vez acompanhados do New Labour, na Inglaterra.

Mas continuamos por aqui a bater em um espantalho...

Mas na América Latina não é essa imagem atualizada que o neoliberalismo tem. Por aqui o neoliberalismo é visto como um misto de fundamentalismo de mercado com conservadorismo antidemocrático. Isso se deve em parte pela experiência marcante no Chile, e também pelo fato de nossos movimentos políticos (não unicamente, mas especialmente os movimentos e partidos de esquerda) terem se mantido afastados de qualquer vertente liberal e se recusado ao diálogo com estas. Isso quando não têm demonstrado falta de compromisso com as próprias regras do jogo da democracia liberal (alô PT e PSOL, até quando seguirão firmes e fortes no apoio à ditadura venezuelana?).

Mas sobretudo, essa visão talvez desatualizada do neoliberalismo na América Latina se deve à imprecisão generalizada ao se falar do conceito. Um estudo analisou um total de 148 artigos num espaço de 14 anos que tratavam do termo. Chegou-se a conclusão que o termo era mal usado, amplo demais, raramente acompanhado de uma definição clara, e que poderia remeter a inclinações ideológicas bem distintas. Algo tão impreciso pode ser qualquer coisa, sendo inclusive facilmente moldável por adversários ideológicos.

Parece que se quisermos falar sobre neoliberalismo com um mínimo de apego à precisão, não devemos ter em mente nem um movimento homogêneo ao longo do século XX, e muito menos um “fundamentalismo de mercado”. O neoliberalismo, pelo menos em sua versão mais recente, reconhece o papel do Estado na manutenção da liberdade, na correção de externalidade negativas, e na promoção do bem-estar individual. E reconhece também que um mercado sem qualquer interferência, ao modo anarcocapitalista, não é capaz de maximizar o bem-estar. Dentro do neoliberalismo não há necessária oposição entre Estado e mercado, entre interferência e liberdade.

Entender então que é parte de uma “crença neoliberal” submeter o social ao econômico em prol de maior produtividade, ainda que gere maior desigualdade, é equivocado. Também é equivocado identificar no neoliberalismo uma crença em abstrações que se impõem sobre pessoas concretas, menos favorecidas. O neoliberalismo difere do liberalismo clássico exatamente por diminuir a relevância de ideais abstratas sobre a liberdade do indivíduo. Para o neoliberal, a liberdade não é dada, no sentido de estar presente no estado natural ou em princípios primeiros. A liberdade deve ser conquistada e garantida, inclusive a liberdade positiva, ou seja, aquela que promove a liberdade por meio da promoção da igualdade, o que aliás demonstra uma das mais importantes funções do Estado.

Existe comumente uma confusão entre neoliberalismo e a ideia de um modelo de capitalismo radical, ou uma forma de anarcocapitalismo. Este sim, um movimento utópico e ideológico, porém que não está disseminado em todo o canto como um conjunto de valores que confere coesão moral/cultural a uma submissão do social ao econômico.

Por fim, vale observar que é um tanto fácil creditar ao neoliberalismo todos os problemas que o mundo ainda não resolveu. Apesar dos enormes avanços sociais das últimas décadas, sem dúvida acelerados pelo crescimento econômico promovido pela ampla liberalização tarifária, o neoliberalismo permanece recebendo a culpa pelo que resta de pobreza no mundo, pela degradação ambiental, por essa atual pandemia e por toda e qualquer coisa que venha a acontecer de ruim no planeta.

E como nós ficamos?

Talvez nosso projeto consiga a proeza de reabilitar o termo neoliberalismo no Brasil, associando-o às suas cores modernas de uma terceira via. Talvez não. De todo modo, há no mínimo um prazer a ser extraído disso tudo: o de provocar a esquerda atualmente estabelecida, que corre enfurecida a clamar "NEOLIBERAL!" ao menor sinal de coisas como:

  • Ortodoxia econômica (ou seja, aceitar o consenso estabelecido nas ciências econômicas).
  • Políticas públicas baseadas em evidências (ou seja, menor espaço para ideologia e marketing barato ditando o que deve ser feito pelo Estado).
  • E, o pior palavrão: livre-mercado! - o maior mecanismo de geração de prosperidade já inventado.

Tal como na fábula do garoto e o lobo, de tanto que a esquerda brasileira gritou "FASCISTAS!" para qualquer visão política divergente de seu clubinho, foi infelizmente eleito um fascista de fato e agora faltam palavras para denunciá-lo.

Quem sabe agora, de tanto xingar todos que discordam de suas posições de "NEOLIBERAIS!", despertaram o movimento mais inovador na política das últimas décadas - movimento que rejeita totalmente o fascismo bolsonarista e que está disposto a se contrapor frontalmente a ele - enquanto à esquerda tradicional agora curiosamente lhe faltam palavras!

Autores: Caio Freire e Fernando Moreno

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One comment on “Os usos e abusos com a palavra neoliberalismo”

  1. O uso do termo neoliberalismo por "acadêmicos" e alunos, mesmo de doutorado na área das Ciências sociais no Brasil mostra o descaso com o verdadeiro conhecimento, em universidades brasileiras (as melhores incluídas), em favor da militância político-partidária.
    .

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