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setembro 16, 2020

A questão fundamental que os americanos enfrentam nas urnas este ano é se os Estados Unidos devem continuar o projeto de democracia liberal, ou se devemos seguir os passos da Rússia, Hungria, Venezuela e outras nações autocráticas dirigidas por homens fortes autoritários. Desejo sinceramente que isto seja um exagero. Infelizmente, a presidência de Trump só nos forneceu alerta vermelho após alerta vermelho. Os líderes mundiais que Trump admira e as políticas que ele está tentando replicar são esmagadoramente autoritários.

Diante disto, é hora de começarmos a prestar mais atenção ao lugar onde estão nossos políticos na régua liberal-autoritária, em vez de quão "à esquerda" ou "à direita" eles se encontram.

Uma pergunta com respostas fáceis

Não é que a régua esquerda-direita seja totalmente irrelevante. Embora com falhas, ele cria uma estrutura de certa forma útil para transmitir aproximadamente o quão igualitário é um político ou partido, em relação a seus rivais. Dito isto, determinar onde os políticos se encaixam neste continuum será sempre mais complicado e mais subjetivo do que o liberal-autoritário. Por exemplo, se um candidato apoia alguns objetivos políticos progressistas, como a saúde universal, mas também alguns objetivos mais liberais, como a desregulamentação das leis de zoneamento e licenciamento, colocamos então essa pessoa à esquerda, à direita, ou no centro? É difícil dizer.

Da mesma forma, digamos que um político (vamos chamá-lo de "Joe") teve algumas visões bastante conservadoras há várias décadas, mas atualmente está concorrendo em uma plataforma social democrata de centro-esquerda. Onde exatamente "Joe" é colocado em nosso continuum esquerda-direita? Mais uma vez, é difícil dizer.

O que não é difícil dizer, entretanto, é que quando o líder de um país envia a polícia secreta para raptar dissidentes das ruas sem o devido processo, chama a imprensa de "o inimigo do povo" e questiona a própria legitimidade das eleições democráticas, este líder despreza em absoluto as restrições dadas pela constituição. É espantoso como muitos republicanos gostam de desempenhar o papel de anticomunistas, mas quando seu presidente tenta imitar a Stasi da Alemanha Oriental, tornando efetivamente a dissidência um crime, toda aquela conversa sobre liberdade e "governo pequeno" é rapidamente esquecida.

Uma estrutura melhor

Uma estrutura melhor para avaliar nossos políticos poderia ser o "liberalismo do medo" da filósofa Judith Shklar. Ela, que veio de uma família de refugiados judeus (primeiro fugindo dos nazistas e depois dos soviéticos), sabia uma ou duas coisas sobre os horrores dos estados totalitários. Shklar sugeriu assim que o projeto de democracia liberal não deveria ser um projeto que visasse atingir a utopia, mas sim uma salvaguarda contra o tipo de sofrimento que invariavelmente ocorre à medida que os estados se tornam mais iliberais e menos democráticos. Embora as diferentes pessoas em uma sociedade pluralista possam discordar sobre o que significa viver uma boa vida, a maioria de nós concorda que menos sofrimento desnecessário é um objetivo desejável.

A democracia liberal, então, é como um cinto de segurança ou um colete salva-vidas. Não é à prova de tolos e pode restringir um pouco seu alcance de movimento, mas você está muito mais seguro com ele do que sem ele. Da mesma forma, o Partido Democrata americano moderno está longe de ser impecável, mas eles estão, na maioria das vezes, tentando fortalecer as instituições democráticas que seus oponentes estão trabalhando arduamente para minar. Você pode não gostar dos democratas, mas não é provável que os democratas o sequestrem, mutilem ou prendam por expressar essa dissidência. Esta é a diferença entre os liberais e os autoritários.

Outros filósofos (John Rawls, por exemplo) desenvolveram concepções mais positivas sobre o que pode ser o liberalismo. Mas, no mínimo, devemos levar a sério o "liberalismo do medo" no clima atual.

Uma decisão fácil

Enquadrar o debate desta forma deveria facilitar muito mais a decisão que os americanos terão em novembro. Mesmo que Joe Biden fosse realmente um político de centro-direita (como alguns esquerdistas afirmam erroneamente), um centro-direitista que não está ativamente buscando corroer a democracia liberal ainda seria melhor do que um homem autoritário e etnonacionalista que Trump é. (eu votaria em uma Angela Merkel contra um Donald Trump no ato).

Se Biden vencer em novembro certamente os americanos deverão reabrir alguns antigos debates: corrupção dentro do stablishment, por que os EUA têm apenas dois partidos elegíveis e quão à esquerda os democratas deveriam ir. Mas tais debates só são possíveis dentro de uma sociedade amplamente liberal-democrática que permite a existência de pontos de vista dissidentes. Preservar e fortalecer a democracia liberal, portanto, deve ser a principal prioridade.

Autor: Chris Dobro, 28 de agosto de 2020

Tradução: Fernando Moreno

Publicado originalmente na Exponents Mag.

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